25 Mai 2016
Pelo 10º ano consecutivo, de Norte a Sul da Itália, passando por Turim, Sanremo, Gênova, Florença, Cagliari, Roma, Siracusa e Palermo, e depois também pela Espanha, em lugares-chave da catolicidade em Barcelona e Sevilha, as semanas em torno do Dia Internacional contra a Homofobia e a Transfobia, instituído em 2007 pela União Europeia para o dia 17 de maio – no mesmo dia de 1991, a OMS apagava a homossexualidade da sua classificação internacional das doenças mentais –, foram animadas por uma longa série de vigílias de oração em memória das vítimas da intolerância homofóbica, procissões de velas, noites musicais, cultos dominicais etc., em torno do versículo do Evangelho de João: "Amai-vos como eu vos amei".
A reportagem é de Giampaolo Petrucci, publicada na revista Adista Notizie, n. 20, 28-05-2016. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Os eventos foram promovidos por históricos grupos de cristãos LGBT italianos em lugares de culto das Igrejas cristãs valdenses ou metodistas, mas – este é o dado em crescimento – também entre paróquias católicas.
Em alguns casos, quem se encarregou da organização dos eventos foram justamente os párocos que acompanham o percurso espiritual dos fiéis gays da própria paróquia, mas também comissões e grupos daquelas dioceses que, nos últimos anos, promoveram uma reflexão pastoral sobre a relação entre fé e homossexualidade.
As pessoas homossexuais e transexuais ainda vivem em condições de dramática marginalização e discriminação na sociedade e na comunidade religiosa, afirma o portal do Projeto Gionata, que relata o que se move em nível italiano no mundo LGBT religioso.
"Porém, nos últimos anos, muitas coisas mudaram. Acima de tudo, mudou o modo pelo qual as Igrejas enfrentam e refletem sobre esses assuntos: há 10 anos, por ocasião das primeiras vigílias, na Itália, as igrejas católicas se recusavam a hospedá-las, enquanto fortes discussões se acendiam sobre a oportunidade de acolhê-las também em âmbito evangélico. Na época, as vigílias eram quase todas realizadas em sigilo, evitando publicizá-las demais. Falar de certos assuntos era quase um tabu na sociedade e, especialmente, nas nossas Igrejas. Nos últimos anos, em vez disso, são muitas as comunidades cristãs que decidiram organizar esses momentos de oração e de reflexão junto com os grupos de cristãos LGBT."
Às margens das vigílias de 2016, trocamos algumas palavras com Innocenzo Pontillo, animador histórico do portal do Projeto Gionata e coordenador do grupo Kairos de cristãos homossexuais de Florença.
Eis a entrevista.
Conte-nos o seu 17 de maio.
Em Florença, há 10 anos, nasceu a primeira vigília para lembrar as vítimas da homofobia, depois do suicídio de um jovem vítima de bullying homofóbico. Neste ano, precisamente no dia 17 de maio, pela 10ª vez, o grupo Kairos organizou um momento de sensibilização contra a discriminação e a homotransfobia, junto com outras realidades, incluindo Libera, Pax Christi, Samaria, Projeto Gionata, Ives de Pistoia, a Paróquia de Nossa Senhora da Tosse de Florença, a comunidade de base das Piagge, L'Altracittà, jornal da periferia, a seção de Florença dos Escoteiros leigos da CNGEI, Delegação Finisterre, a Igreja Evangélica Valdense e a Igreja Veterocatólica de Florença.
Juntos, organizamos uma procissão de velas, que começou a partir das periferias geográficas da cidade, mas também das periferias simbólicas das nossas vidas, e chegou aos lugares-símbolo do centro (Praça do Duomo, Praça S. Marco, Praça Ognissanti, Praça Strozzi). Com a luz do nosso testemunho, quisemos iluminar a noite da nossa cidade e lembrar que cada um de nós pode ser "luz no mundo". Os testemunhos que constituíam o coração da procissão deixavam sem palavras e em profundo silêncio o público que se encontrou ao longo do trajeto. No site do Kairos, kairosfirenze.wordpress.com, é possível ver fotos da procissão e da vigília.
O Dia contra a Violência Homofóbica parece unir muitas pessoas de comunidades de origens diferentes...
Em Florença, por exemplo, a procissão de velas contou com a participação de leigos católicos e evangélicos, religiosas e religiosos, associações e também paróquias, e depois concluiu com uma vigília no templo valdense. A vigília florentina é hospedada anualmente, de forma revezada, por uma comunidade cristã diferente, ora católica, ora evangélica.
Por que cada vez mais paróquias acolhem as vigílias? O que mudou com o pontificado de Francisco?
É preciso dizer que, ainda desde a segunda edição da iniciativa, muitas comunidades paroquiais consideraram escandaloso que se negasse aos fiéis um lugar para rezar, só porque eram homossexuais. Com a chegada do novo papa, os bispos se dividiram: uma maioria que se recusou a sancionar as paróquias que hospedam as vigílias; outros, ao contrário, que quiseram reiterar fortemente a sua contrariedade, especialmente no Nordeste italiano. As palavras de escuta e de misericórdia do Papa Francisco não converteram os corações de alguns bispos, muitas vezes condicionados por outras conveniências e lógicas.
O caso de Gênova é exemplar: no ano passado o cardeal Bagnasco, presidente dos bispos italianos, vetou que uma paróquia da sua diocese acolhesse uma vigília, levantando um grande movimento de protesto dentro da Igreja local. Neste ano, prudentemente, ele evitou mais gestos chamativos e, em vez disso, enviou um delegado seu para a vigília genovesa. Essa mudança de atitude se deve também às reações daquele povo de Deus ao qual o Papa Francisco deu uma nova dignidade, a cujo sensus fidei o papa convida justamente a olhar, porque é lá que, hoje, muitas vezes, o Evangelho dá respostas vivas e palpitantes.
A impressão, às vezes, é que as vigílias são realizadas nas paróquias católicas, porque lá há um padre "iluminado", que atua sem uma coordenação e, muitas vezes, em desacordo com as hierarquias locais e nacionais.
Se não houvesse a iniciativa pessoal de alguns párocos ou freiras, seria muito difícil rastrear a tímida mudança em curso na Igreja italiana. Ainda são muito poucos os bispos que estão se interrogando sobre esse tema. Basta pensar nas dificuldades do Sínodo para discutir serenamente sobre a acolhida às pessoas LGBT. No entanto, o Sínodo ajudou se não para oferecer soluções, ao menos para trazer o tema à tona. E, assim, agora, alguns bispos estão começando a se encontrar com os grupos de fiéis homossexuais e os seus pais, para entender melhor as dificuldades que eles encontram concretamente. Um deles, um dia, me disse: "Eu sempre recebi e li com atenção as cartas dos grupos de fiéis homossexuais, mas não podia fazer nada por eles. Só hoje o Papa Francisco está me colocando em condições de poder responder concretamente a essas solicitação". Em suma, o processo de diálogo com a hierarquia ainda está no início e deve ser totalmente inventado, muitas vezes percorrendo caminhos inexplorados.
Um passo à frente e dois para trás? A Amoris laetitia não foi acolhida com grande entusiasmo pelo mundo gay fiel...
Era muito grande a brecha entre a discussão sobre o tema da acolhida às pessoas homossexuais, embora ela tenha havido no povo de Deus, e as respostas desajeitadas do Sínodo. Para ser franco, no Sínodo, era palpável a dificuldade de muitos bispos de falar desse tema, um assunto ainda tabu para muitos deles. Na Amoris laetitia, o Papa Francisco se limitou a registrar as poucas palavras genéricas que surgiram do Sínodo, mas deixando aberta a porta da Igreja à busca e à experimentação de novas respostas.
Isso está criando também situações contraditórias: por exemplo, na diocese de Turim, nasceu o projeto Alla Luce del Sole [À luz do sol], da equipe Fede&Omosessualità, sob supervisão do encarregado episcopal para o acompanhamento das pessoas homossexuais cristãs. A equipe, depois, organizou em uma paróquia turinense a vigília do dia 7 de maio, que inaugurou o longo caminho das vigílias que se concluirá no dia 31 de maio. Ao mesmo tempo, porém, dentro de algumas estruturas diocesanas turinenses, também há um grupo do Courage, que, em vez disso, defende a acolhida das pessoas homossexuais na Igreja apenas se renunciarem às relações afetivas e viverem no escondimento daquilo que são.
A ênfase de Francisco na práxis pastoral pode ser interpretada como uma estratégia para contornar a doutrina da Igreja, sem modificá-la, deixando que a mudança se imponha, de fato, em nível local?
Eu acho que este é o convite do Papa Francisco: um desafio para a Igreja local que não será isenta de passos em falso. Edith Warton dizia: "Há dos modos para difundir a luz: ser a vela ou o espelho que a reflete". Portanto, se realmente Cristo é a nossa vela, é nossa responsabilidade ser o seu espelho e permitir que essa luz chegue também àqueles que se sentem rejeitados, marginalizados, "errados". Hoje, a Igreja local se faz a pergunta: como ser "espelho" também para as pessoas LGBT? Como católicos, ainda não temos uma resposta, mas finalmente estamos novamente a caminho para buscá-la. Será que, talvez, não chegou a hora de a Igreja se tornar companheira de viagem daqueles que batem na sua porta?
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Homofobia: o que muda na Igreja entre resistências e "efeito Francisco" - Instituto Humanitas Unisinos - IHU